O triângulo ESG, banca e tecnologia

“The social responsability of business is to increase its profits.” A afirmação de um dos mais conceituados economistas do século XX, Milton Friedman, proferida em 1970, está hoje seguramente ultrapassada e fora de moda.

Hoje em dia, é objetivamente mais correto afirmar que um dos meios para uma empresa atingir os seus objetivos financeiros, nomeadamente o lucro, é comprometendo-se com os princípios ESG (Environmental, Social e Governance). Estes princípios têm inclusive demonstrado ser uma oportunidade de negócio para as empresas e, consequentemente, para as economias em geral.

Sendo a banca um dos maiores – e mais seguros – vetores para a dinamização de uma economia, também o setor bancário se afirma como fundamental para assegurar a nossa sustentabilidade a nível global e para o compromisso assumido pelos Estados no Acordo de Paris (sobre alterações climáticas), de 2015.

Como ponto de partida, convém frisar que as instituições financeiras – tal como as não financeiras – têm incluído nas suas agendas o comprometimento com os objetivos de desenvolvimento sustentável. E este não é sequer o único papel reservado aos bancos no que diz respeito ao alinhamento com estes objetivos.

As instituições bancárias, sobretudo através do crédito concedido aos agentes económicos, são o principal veículo para a implementação e dinamização de novos projetos na economia. Daí ser agora também necessária a inclusão de critérios de avaliação ESG nos seus processos internos de análise de investimentos e financiamentos.

As orientações legais das próprias entidades reguladoras já reconhecem este papel, ao determinarem que a análise de risco passe a incorporar critérios de sustentabilidade, concretamente os fatores de risco físico e de transição que incorporam o risco climático.

Estes “novos” fatores acabam também eles por impactar os principais riscos financeiros e não financeiros (risco de crédito, risco de mercado, risco operacional, etc.). Exemplo? Se um banco já atribui benefícios a um financiamento de menor risco, quando comparado com outro de maior risco, faz também sentido que a aferição da pegada ecológica e social de um determinado projeto tenha impacto no comissionamento ou margem financeira que esse banco se dispõe a ter no processo de financiamento desse projeto. 

A EBA (European Banking Authority) publicou, em janeiro de 2022, um normativo que torna obrigatória a publicação de um conjunto de divulgações do chamado Pilar 3 sobre riscos ESG. O objetivo é promover a transparência do impacto dos riscos ambientais, sociais e de governance nos já conhecidos riscos que agravam tradicionalmente o balanço dos bancos. Este novo normativo torna também explícita a necessidade de gestão e mitigação destes riscos e a aferição das exposições alinhadas com o Acordo de Paris, o que torna assim necessário incluir critérios ESG nos modelos de negócio, estratégia e governance dos próprios bancos.

A par do IASB (International Accounting Standards Board), entidade que define as Normas de Contabilidade IFRS, foi recentemente criado o ISSB (International Sustainability Standards Board) com a responsabilidade de definir as Normas de Divulgação de Sustentabilidade das IFRS. O resultado está à vista! No final de março, foi divulgada a IFRS S1 (draft) referente aos requisitos gerais para a divulgação de informações financeiras relacionadas com a sustentabilidade, bem como a IFRS S2 (draft) relacionada com a identificação, aferição e divulgação de exposições afetadas pelas oportunidades e riscos climáticos.

Em linha com todas estas iniciativas, um dos principais desafios das instituições financeiras está hoje relacionado com a nova dimensão de dados a considerar na análise da qualidade dos seus ativos, projetos de investimento, processos bancários comuns e apuramento de margens. A partir de agora, torna-se necessário incluir ratings ESG na sua análise de risco, evidências ESG de empresas e projetos (ex: emissões de CO2, responsabilidade social, idoneidade do governance), critérios para gestão de fundos verdes e acesso a um mercado de capitais sustentável. Este último fator tem, aliás, servido como veículo para a transição para uma economia mais verde.

Mais uma vez, com recurso à transformação digital sustentada, torna-se imprescindível ter em conta as necessidades e custos operacionais relacionados com a análise e tratamento desta nova dimensão de dados. Em bom rigor, esta nova dimensão deverá acarretar para os bancos a definição de mais ou melhores processos de negócio, nomeadamente processos de análise de risco de crédito de clientes e projetos, processos de comercialização de produtos e reporte de informação interna ou dirigida ao regulador.

Todas estas alterações (necessárias) poderão exigir a metamorfose de alguns dos processos atualmente existentes, sendo estas mudanças mais eficientes de implementar com o recurso a tecnologia, processos de leitura, interpretação, análise e transformação de dados, automatização de procedimentos e digitalização.

Tal como a banca, pelo seu impacto na economia, tem um papel crucial na preocupação por um mundo mais sustentável, também a tecnologia se mostra indispensável para uma eficiente implementação da cultura ESG.

Rita Inácio, integra o Departamento de Governance, Risk & Compliance da Asseco PST, empresa de Tecnologias de Informação, especialista no desenvolvimento de software bancário e um referencial na criação de soluções tecnológicas e conhecimento em todos os mercados onde atua.

Natural de Lisboa (Portugal), é licenciada em Engenharia de Telecomunicações e Informática, tendo concluído o curso em 2010, no ISCTE-IUL. Frequentou posteriormente o Programa Avançado de Gestão para Executivos (PAGE), na Universidade Católica de Lisboa, focado em áreas como Estratégia, Transformação Digital, Controlo de Gestão e Liderança. Participou também em iniciativas de formação enquadradas em Risk Management e Business Process Management.

Iniciou a sua carreira profissional em 2010, na Capgemini, na área de consultoria, tendo participado em projetos de implementação em clientes nos setores da banca e saúde. Daqui transitou para a Indra Portugal, onde esteve igualmente envolvida em projetos na área bancária, nomeadamente em serviços de consultoria e implementação de soluções tecnológicas de apoio ao cálculo de resultados e rentabilidade da carteira de ativos. Tem igualmente experiência acumulada na realização de estudos de mercado enquadrados nos setores bancário e segurador (solvência).

Em 2014, iniciou o seu percurso na Asseco PST, participando como consultora e gestora de projetos de consultoria na vertente Risco, mais concretamente Risco de Crédito enquadrado em serviços de consultoria de negócio e implementações tecnológicas – de que são exemplo soluções de apoio à mensuração de fatores de risco utilizados em âmbito regulamentar, provisões, ECL (imparidade) e classificações de risco (scoring e rating) de apoio à decisão.

Atualmente, é responsável pela área de Risco, desempenhando um papel de coordenação da equipa de consultoria de negócio em projetos internos e de cliente na vertente risco.

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